‘Deus disse-me’

 

Como sabemos nós se Deus nos está a orientar em direcção a uma determinada decisão, ou se é apenas algo que queremos fazer pelas nossas próprias razões?

 

 

“Deus disse-me para mudar a minha família para a Arábia.”

 

Alex olhou espantado para o seu amigo, perguntando a si próprio se ele estava apenas gracejando ou tinha enlouquecido. Alex conhecia Tom havia mais de 10 anos. Foi seu padrinho de casamento, além de ser padrinho das gémeas de Tom e Alicia. E, Alex sabia que Tom e Alicia estavam tão vocacionados para a vida missionária na Arábia como peixes na água.

 

“Bem, é uma decisão bastante complicada, Tom. Como sabes que é, realmente, essa a vontade de Deus?”

 

“Muitas coisas.” Tom olhou fixamente para a sua chávena de café. “O sermão do pastor Mel, há algumas semanas atrás fez-me pensar muito.” Olhou para Alex. “ Somos bastante egoístas aproveitando as coisas boas da vida aqui, na América, enquanto que existem pessoas, por todo o mundo, a necessitar de ajuda. Orei muito sobre isto e pareceu-me que Deus respondeu que nós deveríamos ir.”

 

Alex acenou com a cabeça em sinal de concordância, ponderadamente, pesando a forma como responder. “Como te deu Deus essa resposta?”

 

“Bem, por um lado, eu estava a falar com a família Hogarth, tu conheces, os missionários na Arábia. Eles disseram que precisavam de ajuda.”

 

“Que tipo de ajuda?”

 

“Bem, tu sabes que sou bastante bom como carpinteiro e disseram que têm orado, precisamente, por isso – alguém bom em carpintaria. Foi como se Deus me estivesse a dizer, ‘É isto que quero que faças, Tom. ‘”

 

“O que pensa Alicia acerca disso?”

 

“Ah! Ela não está tão entusiasmada quanto eu, mas estou a orar para que isso aconteça.”

 

“Não tão entusiasmada? Disse Alex.

 

“Bem, ela está, absolutamente determinada contra isso. Ela, por vezes, consegue ser bastante obstinada. Contudo, penso que o Senhor mostrar-lhe-á que é a melhor coisa a fazer.”

 

“Hum, estou a ver,” Alex despejou um pacote de adoçante em pó no café. “E se Ele não o fizer?”

 

“Ele fá-lo-á, Alex. Eu confio no Senhor. Tenho, mesmo um bom pressentimento em relação a esta decisão.”

 

Tom não é o único. Todos os dias, algures, Cristãos convencem-se a si próprios que Deus lhes está a dizer para casar com uma determinada pessoa, aceitar um determinado emprego, ir para um determinado colégio ou “sai daí” e faz algo realmente bom e significativo para ti.

 

Mas, está Ele – de facto?

 

Como podemos nós saber se Deus está, de facto, a orientar-nos na tomada de uma importante decisão ou se, possivelmente, estamos apenas aborrecidos e frustrados com a nossa situação actual e procuramos uma mudança ou uma saída? Uma solução timbrada com o nome de Deus nela?

 

Aqui estão alguns pensamentos sobre tomadas de decisão que Deus disse para que eu vos transmita. Ou, talvez, Ele não o tenha feito. De qualquer modo, aqui estão os meus dois tostões de mérito. É claro que são dois tostões de mérito biblicamente enraizados ou se preferir, duas minas, dois dinares ou duas migalhas de mérito, tanto faz.

 

1.      Quando Deus falou com as pessoas na Bíblia, não havia dúvidas de que era uma mensagem vinda de Deus. Era, normalmente, entregue pessoalmente por um anjo e, normalmente, apavorava até às entranhas do destinatário da mensagem.

 

2.      Quando Deus tinha de dizer às pessoas o que queria que elas lhe fizessem, era, normalmente, algo que estas não queriam fazer.

 

3.      Por vezes, as nossas orações pedindo a bênção de Deus, são, de facto, orações para conseguir aquilo que nós próprios queremos, sem ter em linha de conta a opinião de Deus. Considere o Rei Acabe, quando quis atacar o Rei da Síria o qual andava a roubar algumas das suas cidades favoritas. Acabe perguntou ao profeta Micaías se ele seria vitorioso. Micaías disse-lhe a verdade, muito embora todos os outros “profetas” tivessem dito que, com toda a certeza, Acabe ganharia a batalha. Acabe não estava à procura da vontade de Deus; ele estava à procura da confirmação para a sua própria vontade. Ele estava a fazer um disparate, mas também queria a bênção de Deus para cobrir a sua retaguarda.

 

É evidente que Deus não está a proteger pessoas obstinadas. Acabe atacou o rei da Síria e foi apanhado com uma seta de um armorial defensivo. É óbvio que Deus não nos impede de tomar decisões menos boas quando estamos determinados a fazê-las.   

 

4.      Deus é bastante claro no que Ele nos “diz” para fazer. Toda a lei, integralmente, está sintetizada num simples comando: ‘Ama o teu próximo como a ti mesmo. “ Pelo valor deste comando, não temos que ir para o outro lado do mundo para encontrar o nosso próximo.

 

5.      Uma das razões pela qual nós ansiamos por fazer algo fantástico por Deus, é que nós estamos inseguros em relação à nossa posição perante Ele, e temos a esperança que se nós fizermos algo de fantástico, tal como mudarmos para um canto longínquo da Terra e sermos missionários, Deus poderá gostar mais de nós e podemo-nos sentir melhor quanto ao nosso relacionamento com Deus.

 

Esta não é a forma de pensar do evangelho – é a forma de pensar religiosa. Deus ama-nos onde quer que estejamos e existe um trabalho cristão “grandioso” em sermos nós próprios, como cristãos e mostrar o amor de Cristo às pessoas que encontramos todos os dias.

 

6.       Mudar a nossa localidade não opera nenhuma mudança em nós. Não podemos fugir dos nossos problemas. Se eu sou um indivíduo miserável e grosseiro em Lisboa, serei o mesmo em Bangladesh. Se sou uma pessoa estúpida e irritadiça com a minha primeira esposa, serei, também da mesma forma para com a minha segunda ou terceira esposa.

 

Se necessitamos de mudar, devemos mudar, em primeiro lugar, a nossa maneira de ser e não, somente, as circunstancias que nos rodeiam. Devíamos orar para termos um coração limpo e cheio de amor divino, e só então levarmos este nosso novo coração para onde quer que se seja que a vida nos conduza, não onde nós pensemos que poderá haver mais glória espiritual.

 

 

Não se esqueça que a glória espiritual é invisível, e está presente em qualquer acto de bondade e amor altruísta. Geografia ou riquezas não estão relacionadas com isto. Se eu quiser fazer algo “mais” por Deus, faria bem em começar por ser um melhor marido e pai, ou melhor esposa e mãe.

 

Algumas pessoas ordenadas dão concelhos menos bons. Não pense que quando um pastor ou missionário diz, “ Olha, eu penso que Deus está a chamar-te para fazeres isto ou aquilo,” ele esteja, necessariamente a saber o que está a dizer. Diz o provérbio que “Numa multidão de conselheiros, há segurança,” Não devemos tomar a opinião de uma pessoa bastante considerada como se fosse a palavra sagrada de Deus, apenas por ser isso que queremos ouvir.

 

Reflexões conclusivos

 

Deus disse-me para …” é, com frequência o eufemismo para “Eu quero e eu tinha decidido…”

 

Não é errado querer fazer algo e decidir concretiza-lo. Porque não sermos honestos? Porque não dizer? “Decidi ir para a África e trabalhar numa clínica de saúde. Ore por mim, por favor.” Isso seria honesto. Mas 99% (na minha Opinião, é claro), quando alguém diz, “Deus disse-me para ir para África e trabalhar numa clínica de saúde,” estão a ganhar na rapidez e a perder na honestidade.

 

Deus pode, e abençoa-nos nas nossas decisões sem que as tome por nós. Deus dá-nos a capacidade para avaliar os factores nas nossas vidas, obter conselhos, fazer alguma pesquisa, estudar os assuntos em causa e tomar decisões bem ponderadas e com bases em boa informação. E devemos pedir-lhe para que nos oriente a tomar as decisões mais acertadas.

 

Mas então, porque não permitimos que seja Deus a liderar-nos? Isto é, porque não deixar que seja Deus a orientar-nos em vez de sermos nós a decidirmos, em primeiro lugar (pelas nossas razões pessoais quer o admitamos ou não), e pedirmos a sua aprovação (tal como Rei Acabe) e depois anunciar que “Deus disse-me para…” Isso é criar uma protecção à nossa volta, como se estivéssemos dentro de uma concha, evitando assim a nossa própria responsabilidade para as nossas próprias decisões.

 

Não seria interessante e simpático apreciar a liberdade divina para dizer: “Senhor, tenho vários caminhos à minha escolha, e baseado em todos os factos segundo o meu entendimento, aqui vai o que penso que, provavelmente, deveria fazer. Por favor, tem misericórdia de mim agora que vou escolher um dos caminhos, pois, como tu sabes, eu sou um constante idiota. Eu sei que sempre estiveste presente quando necessitei de ti, e sei que, também olharás por mim neste momento. Desta vez não permitas que os tombos sejam demasiado difíceis de aguentar.

 

“Se houver algo que eu não esteja a entender bem, poderias mostrar-me antes que seja demasiado tarde? E se eu perder o teu sinal, então digo novamente, por favor, tem misericórdia de mim, um pecador e um constante pateta. E mais uma coisa, se esta é uma porta ardil em vez de uma porta aberta, importar-te-ias de não largares a minha mão até eu chegar onde tenho que estar? Muito agradecido pelo teu amor, Ámen.”

 

 

 

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Artigo Original Inglês: ‘God told me’      Nome de Autor: Mike Feazell                             2006-02 

Tradução: ‘Deus disse-me’                    Nome de Tradutora: Conceição Galego           2006-03